domingo, 29 de agosto de 2010

O homem modulado...

The City of  Drawers
Salvador Dali - 1936
[...] o homem modulado é, antes e acima de tudo, um homem sem essência. Ao contrário da mobília modulada, porém, o homem modulado faz por si mesmo o trabalho de montagem e remontagem. É modulado mas também automodulante. [...] vive como um conjunto de tarefas a serem realizadas (Zygmunt Bauman - Em busca de uma política)

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Arte: território de singularidades

Para melhor entender o mundo das imagens pensei ser interessante investigar o universo da arte. Aos poucos, percebi que a arte não trata somente das questões conceituais relativas à imagem: cores, linhas, formas, volumes, sons, movimentos e estilos. Ela também atenta para os afetos, os diferentes modos de percepção, faz sentir o que não se vê, as forças e as relações de força.
A arte questiona a linguagem trivial, as regras e convenções, sem renunciar às relações que se estabelecem entre a verdade (que só existe enquanto vontade de verdade) e o pensamento (que funciona como resistência aos conceitos impostos). Leva o indivíduo a refletir sobre si e sobre o mundo. É até bastante provável que seja essa a sua função: fazer pensar, propiciar uma nova leitura sobre visualidades viciadas e limitadas. A arte abre possibilidades a quem quer que esteja disposto a não apenas fixar o olhar no belo, mas no além disso.
A arte é também uma expressão da subjetividade plural, possibilitando múltiplas leituras que transitam entre os territórios da sensibilidade, da razão, numa mobilidade dinâmica, livre de um significado fixo, como num caleidoscópio.
Rompendo a concepção espaçotemporal do cientificismo positivista, a arte aponta para uma abordagem multidisciplinar, mostrando-se como um agenciamento que se conecta a outros agenciamentos.
É um modo de experimentar a realidade, o mundo e a si mesmo, numa incessante metamorfose que envolve o sujeito histórico, social, cultural, exercendo grande fascínio sobre o homem, ser de linguagem, conduzindo-o, muitas vezes, a um estado de encantamento.
Enfim, a arte é necessária “[...] como ‘proteção e remédio’, [...] para suportar a quebra do otimismo teórico quanto para levar o conhecimento além de si mesmo, para a sua própria transformação” (LARROSA, 2004, p. 137).
Répteis - M. C. Escher - Litografia, 1943

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

[...] caminhar não é tanto ir de um lugar a outros, mas levar a passear o olhar. E olhar não é senão interpretar o sentido do mundo, ler o mundo. [...] O leitor não olha o autor, nem sequer o livro, mas a paisagem, o mundo aberto e sempre por ser lido de uma maneira renovada. (LARROSA, 2004, p. 50)
Impressão, nascer do sol
Claude Monet - 1872

domingo, 22 de agosto de 2010

Imagens e memória

Já tentou lembrar de algum fato ocorrido há muito tempo? As imagens vêm à sua mente e aquela história (a sua história) é real? E se aquele fato tiver sido fotografado? Olho a foto e é como se estivesse revivendo o momento. Muitas vezes, tenho a sensação de sentir cheiros que se relacionam com o instante do "clic".
À imagem é imputada (também) a função da lembrança, da memória. Quando olhamos uma fotografia, assistimos a um filme, uma parte de nossa vida se faz presente, ainda que o conteúdo dessas imagens esteja longe de apresentar o que nos parece real, ainda que a “memória artificial” tecidas pelas imagens e sons organizados segundo uma sintaxe arranjada exista só no rol das lembranças.
A memória é constituída por imagens, descrições, acontecimentos, experiências. Caminha junto com o olhar e com o pensamento. As tessituras que o universo imagético nos oferece, então, fazem mais que misturar imagens às lembranças, se abrindo a novas outras muitas redes que trasncendem a mera informação.
Imagens, idéias, memórias, mapeamentos, experimentações: ampliação das potencialidades quando se trabalha buscando a superação dos limites impostos pela supervalorização da informação em detrimento da experiência, das coisas que nos acontecem, que nos atravessam.

"Como se fora a brincadeira de roda, memórias..." (Redescobrir, Gonzaguinha)
 A dança - Henri Matisse - 1910

sábado, 21 de agosto de 2010

Imagens...

Se tivesse que escolher entre palavras e imagens para me comunicar, ficaria com as imagens. Meu pensamento viaja longe tentando mapear as possibilidades, as histórias (visíveis e invisíveis) que brotam delas, dos entrelaçamentos com outras imagens, sons, cheiros e gostos, das relações infinitamente complexas que se entrecruzam nos infinitos planos. Penso, junto com Manguel (2001, p. 21), que “[...] qualquer que seja o caso, as imagens, assim como as palavras, são a matéria da qual somos feitos”.
O universo imagético faz a mediação do ser com o seu entorno, contribuindo para a produção de outras formas de pensamento.
As imagens possibilitam a criação dos sujeitos, a invenção do desejo e se configuram como forma e força de expressão. Essa criação, que parte da multiplicidade que há em nós, dá vazão ao delírio, à fantasia e a toda potência presente na linguagem artística, possibilitando a invenção, o surgimento do novo que se dá no entrecruzamento intensivo de fluxos, movimentos e relações.
As imagens e sons do mundo são como uma enorme composição macrocósmica. Para percebê-la, é necessário desvincular-se de uma sensibilidade fragmentada, formada, muitas vezes, de forma traumática nas relações do cotidiano. Ensinaram-nos a “separar” nossos sentidos para desenvolver acuidades específicas e uma apreciação disciplinada. Na busca de nossa virtuosidade, fomos obrigados a deixar que muita da nossa percepção se contraísse e uma total e prolongada separação dos sentidos resulta em fragmentação da experiência. O ensino da música, da dança, ou da pintura, por exemplo, costuma utilizar um conjunto de receptores sensitivos com a exclusão dos outros.
Mas a vida é multisensorial, e as artes se abrem em multimeios. O que temos diante de nós aponta para a necessidade de destacarmos formas de arte que envolvam os multisentidos.
Mas isso, é uma (outra) longa história...

"...a capacidade de ver o invisível"
Carta branca - Rene Magritte - 1965